Há dois anos, padre Fábio de Melo incursionou pelo universo da MPB em um dos melhores álbuns da discografia do religioso cantor mineiro, Deus no esconderijo do verso (2015). O recém-lançado álbum Clareou (Sony Music) segue pelo mesmo universo a reboque do mesmo produtor do disco anterior, o cearense José Milton, habitual piloto de álbuns de cantores como Fagner e Nana Caymmi. A diferença está no tom. Clareou é mais popular, vai mais direto ao ponto, tirando as mensagens do esconderijo dos versos.
No 20º álbum da discografia, padre Fábio se vale de letras positivistas de músicas de compositores populares – como Dudu Falcão, Elias Muniz, Frejat, Renato Teixeira e Serginho Meriti, entre outros nomes – para pregar o bem em sintonia com os valores cristãos. Nesse sentido, a sagaz regravação do hit viral Trem bala (Ana Vilela, 2016) – posto em trilho rural sob o toque do acordeom de Bebê Kramer – caracteriza bem o tom de Clareou, álbum arranjado à moda clássica pelos pianistas Cristóvão Bastos e Eduardo Souto Neto.
Com mais propriedade, Clareou ilumina a beleza do cancioneiro de Flavia Wenceslau (compositora paraibana já avalizada pela cantora baiana Maria Bethânia), de quem Fábio regrava Te desejo vida (2010). E, como no interior tem Deus (muito) mais do que na selva das cidades, a lembrança da toada Raízes (Renato Teixeira) arremata o disco no toque da viola de João Lyra, um dos músicos virtuosos arregimentados por José Milton para dar forma a este disco em que padre Fábio de Melo tira Deus do esconderijo do verso, celebrando 20 anos de carreira fonográfica com coerência e (certa) ousadia na escolha de repertório profano que propaga os sagrados valores do bem-viver.
Fonte: G1